UMA PAIXÃO


Mais uma noite, mais uma noite entre muitas e muitas, fico aqui a pensar, vejo a folha, o lápis e nada surge entre meus dedos. Quero sair para me alimentar, entretanto não posso, quer uma palavra... nenhum rabisco é traçado por minha mão envelhecida. O tempo passa, voa, anos são como noites e noites passam como minutos. Não consigo aproveitar nada, minha força, meus caninos... minha mente vagueia por entre o breu que a tomou, pelo breu que também há la fora e que protege a todos os mortais neste momento. Está tudo escuro, tudo. Nada vem ao meu socorro, é desesperador esse inferno próprio.

Surge o primeiro movimento, um traço, uma palavra a fome de sangue que me puxa de volta ao mundo. Junto o mais profundo sentimento também emerge do breu, me faz sangrar novamente, o mais triste deles o mais belo de todos, paradoxo, incógnita da vida, ele, esse sentimento que gira em torno de si trazendo aflição, medo, beleza, saudade, carinho, ciúme. Essa dor no peito que vem de mãos dadas com seu parceiro mais terrível. Fujo, ando pela sala. Percebo o tapete ao meus pés, os detalhes dourados misturados com o vermelho, a lareira a minha frente com a chama apagada, o quadro que no momento nada me diz e apenas dá a sensação de que também me observa.

O que esse quadro pensa, o que essa imagem percebe? Deve-me achar um louco..." - nada me alivia. Tento espairecer, vou a janela, abro a pesada cortina vermelha e vejo as estrelas, ó pesadelo, elas formam a imagem que no momento abomino, trazem novamente aquele sentimento ao meu peito, a dor que começa no coração e se perde pelo corpo. - Preciso parar, voltar a mim. Não posso ser dominado por um sentimento... Sou mais forte que isso... engano meu... engano meu...

É tudo o que penso, é tudo que consigo, pensar... nem sair para matar um humano, acabar com essa fome que me mata, ou é esse sentimento que me mata? Não posso raciocinar, ó pesadelo... Não é minha mente que me domina, é meu coração, dono desse sentimento que toma-me um fraco, alguém que sequer consegue lutar consigo mesmo, sequer consegue raciocinar sem pensar no que não deseja, mas tanto deseja.

A noite voa. Pego um livro, não vejo nada, apenas penso, meu coração pensa, apenas sangro uma paixão, o amor e o ódio que ela traz consigo, um sentimento que não deveria possuir, ou deveria? Um sentimento que não quero, é o mais certo, algo que sempre me destrói, algo que sequer deixa-me em paz um minuto, algo que infelizmente ainda trago comigo e ainda não consegui vencer.

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